domingo, 17 de agosto de 2008

Criatividade para a reabilitação urbana na região norte

Criatividade é a palavra-chave a usar para a reabilitação urbana na região norte
Ricardo Luz e Carlos Martins falam do trabalho de campo a partir do qual traçaram um mapa optimista para o futuro das actividades criativas e culturais na cidade do Porto
A Há duas palavras que são "conjugadas" com especial veemência por Ricardo Luz e Carlos Martins, quando falam do potencial que as indústrias criativas têm para a revitalização do Porto e da região norte: optimismo e "empreendedorismo". Esta última, ainda não consagrada no vocabulário da língua portuguesa, começa a surgir com cada vez maior persistência nos estudos e nos relatórios de pendor económico com que empresas e instituições se propõem enfrentar a crise que a região e o país atravessam.
Ricardo Luz e Carlos Martins são dois economistas formados na Universidade do Porto, com especializações em gestão empresarial e em áreas como o desenvolvimento urbano sustentável (o primeiro, em Cranfield, Inglaterra) e em turismo cultural (o segundo, em Barcelona). São também sócios fundadores das duas empresas (Gestluz e Opium) que, com a Horwath Parsus Portugal e a Creative Consultancy do inglês Tom Fleming, elaboraram o estudo para o Desenvolvimento de Um Cluster de Indústrias Criativas na Região Norte, tornado público há duas semanas na Fundação de Serralves, uma das entidades que tomou em mãos este desígnio em resposta a um desafio da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Norte.
"As indústrias criativas têm sido o ponto mais avançado da revitalização urbana em muitas cidades degradadas, principalmente da Europa do Norte, com o Reino Unido no centro destas experiências", diz Carlos Martins. Foi a essa luz que ambos os consultores convocaram a experiência de Tom Fleming, mas também de Charles Landry, autor do livro The Creative City: A Toolkit for Urban Innovator (2000) e um dos "papas" da teorização das indústrias criativas, para dirigir o levantamento de território que foi feito no Porto e no Norte durante os últimos seis meses.As conclusões desse estudo constituem um autêntico manual de acção e de optimismo. O Porto e o Norte têm todas as condições para começarem a trilhar um novo caminho e para abrir essa nova "janela de oportunidades", como agora se diz, que são toda uma série de estruturas patrimoniais e de actividades potencialmente criativas que estão disseminadas pelos principais núcleos urbanos da região, mas a que falta estabelecer "conectividade" e dar uma nova "alavancagem" (duas outras palavras novas no vocabulário deste sector de actividade)."O Tom Fleming trouxe-nos a metodologia e uma experiência de campo principalmente centrada no seu país, como em mais de 30 outros em todo o mundo ", justifica Ricardo Luz, referindo-se à reunião das três empresas portuguesas com o consórcio do britânico.
Regresso à Baixa
Tanto Ricardo Luz como Carlos Martins realçam o facto de o Porto viver actualmente uma conjuntura especialmente propícia à experimentação e à aplicação prática de algumas medidas tendentes a empreender novos caminhos. O programa de revitalização da Baixa e da zona Património Mundial actualmente em curso, nomeadamente através da acção da Porto Vivo -Sociedade de Reabilitação Urbana (para a qual têm prestado serviços) é "um campo de experiência fantástico", nota Carlos Martins. E associa-lhe o movimento de regresso das pessoas ao centro urbano, como todas as noites se pode verificar na "movida" nas ruas em volta da Avenida dos Aliados (Passos Manuel, Almada, Cândido dos Reis, Galeria de Paris, esplanada do café Piolho).
"Dizia-se que, no centro do Porto, há muitas zonas que não têm ninguém. Hoje acontece um pouco o inverso: há zonas que, durante o dia, não têm ninguém, mas à noite estão cheias. Inverteu-se o fenómeno. Há agora que reequilibrá-lo, fazendo-o perdurar ao longo das 24 horas do dia", reclama Carlos Martins.
Os dois empresários-consultores acreditam que este regresso à Baixa "é um fenómeno identitário e simbólico" e é irreversível. "Há um clic que já se verificou", nota Ricardo Luz, evocando a sua experiência de "trabalho no terreno" nos últimos quatro anos. Este fenómeno tem-se verificado nas áreas, e nas horas, do lazer (restaurantes, cafés, bares e galerias), mas falta-lhe ainda a dimensão residencial, o que só se conseguirá, diz Carlos Martins, quando for alterada "a rigidez no mercado das rendas" e quando se modificar o "ambiente social pouco simpático, marcado ainda pela mendicidade, pelo consumo de droga e pelos problemas sociais" que aí existem.
"Mas, em qualquer cidade, as partes mais degradadas sempre foram ocupadas primeiro pelos artistas; depois é que vêm as outras camadas, até à classe média alta", assinala o empresário da Opium.

Um mapa criativo
As indústrias criativas têm sido o ponto estratégico para a revitalização urbana. E o levantamento que os autores fizeram no centro urbano portuense identifica uma grande quantidade (269) e diversidade de núcleos de actividades criativas, entre os espaços comerciais, culturais e de lazer nocturnos, mas também estabelecimentos de ensino artístico e organizações culturais. O mais curioso do mapa portuense destas actividades criativas é ele denotar uma distribuição bastante equilibrada por toda a trama do centro da cidade, desde a Sé a Cedofeita, de Miguel Bombarda a Santo Ildefonso - mas é também sem surpresa que a maior densidade se encontra na zona das galerias de arte (Miguel Bombarda/Palácio de Cristal) e nas ruas a poente dos Aliados.Martins e Luz encontraram aqui alguns sinais de "clusterização" (outra palavra nova). E por razões práticas óbvias: um arquitecto procura estabelecer o seu atelier numa zona onde haja também maquetistas e designers, porque precisam uns dos outros."Falta ainda massa crítica, de clientes e de criadores, mas os elementos existem aí, e é por isso que vale a pena trabalhar sobre eles", acreditam os autores do estudo, que vêem com bons olhos a decisão da CCDR de criar uma agência e de lançar um concurso público aos dinheiros comunitários para ajudar a desenvolver esta potencialidade.
269 núcleos de actividades criativas foram identificadas pelos autores do estudo dentro do perímetro do centro urbano do Porto
1,4 por cento (equivalentes a 6358 milhões de euros) é o peso no PIB português das indústrias criativas, em 2003. Na União Europeia, esse peso é de 2,6 por cento (654 mil milhões de euros), empregando 5,8 milhões de pessoas
30 por cento das pessoas nas indústrias criativas em Portugal são licenciadas
Jornal Público 16.08.2008, Sérgio C. Andrade

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Indústrias criativas

As indústrias criativas são a "visão" para revitalizar o Norte de Portugal
Estudo para o desenvolvimento de um “cluster” criativo na região norte é hoje apresentado na Fundação de Serralves
O Norte deverá apostar em tornar-se na região criativa de Portugal - é esta "a visão" e o desafio lançado pelos consultores britânicos Tom Fleming e Charles Landry, nas conclusões do estudo que elaboraram para o desenvolvimento de um “cluster” de indústrias criativas na região norte, que hoje de manhã será apresentado na Fundação de Serralves, no Porto.
"A região norte de Portugal enfrenta sérios constrangimentos que ameaçam a sua competitividade e a sua capacidade de recuperar dinâmicas de produção de riqueza, mas tem em si os recursos, os agentes e a energia de que necessita para o fazer com sucesso", dizem os autores deste estudo-radiografia, sobre o qual elaboram uma estratégia e um ambicioso plano de acção tendo em vista "o reforço da massa crítica do capital criativo da região".
O plano de acção tem três eixos estratégicos: apostar na capacidade criativa, no planeamento e definição de políticas e em tornar atractivos os lugares criativos, enumera o estudo. O documento aponta também a necessidade de criação de uma estrutura autónoma de governação - chama-lhe Agência para o Desenvolvimento Criativo do Norte de Portugal - que deverá ser participada pelos principais agentes do território e mobilizar a iniciativa privada.
Tom Fleming e Charles Landry são reconhecidos especialistas internacionais no estudo das indústrias criativas e da sua importância para a revitalização de cidades deprimidas. O consórcio Tom Fleming Creative Consultancy foi o escolhido pela Fundação de Serralves, que liderou uma parceria em que também intervêm a Casa da Música, a Sociedade de Reabilitação Urbana da Baixa Portuense e a Junta Metropolitana do Porto, todos respondendo a um desafio lançado pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), à procura da tal "visão" inovadora para ajudar ao desenvolvimento desta região.Odete Patrício, directora-geral de Serralves, justifica a opção pelo consórcio de Fleming com a sua experiência "muito ligada ao terreno". Numa conferência apresentada no Porto no início de Fevereiro, quando o lançamento do estudo foi anunciado, Fleming citou o exemplo da cidade inglesa de Sheffield na década de 1980. A aposta nas indústrias criativas ajudou Sheffield a sair da crise em que a decadência da indústria da metalurgia a tinha então mergulhado.
No estudo agora feito para a região Norte, os autores fizeram incidir a sua atenção no centro histórico e na Área Metropolitana do Porto, e também nas cidades universitárias envolventes, como Braga, Guimarães, Vila Real e Aveiro.
As duas primeiras são as que, na opinião de Fleming e Landry, apresentam "a dimensão e o carisma capazes de potenciar" as indústrias criativas: pela importância dos centros de investigação e desenvolvimento da Universidade do Minho, pela classificação patrimonial pela UNESCO do centro histórico de Guimarães e pela oportunidade que o acolhimento da Capital Europeia da Cultura em 2012 cria de "estabelecimento de um compromisso a longo termo e assumindo-se como representante do potencial criativo da região e das suas indústrias criativas".
O estudo centra-se sobretudo no centro histórico e área metropolitana do Porto e em cidades como Braga ou Aveiro
Jornal Público - 23.07.2008, Sérgio C. Andrade

quinta-feira, 12 de junho de 2008

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Richard Florida

Esteve recentemente em Portugal um dos individuos mais influentes na concepção das cidades criativas.
Na altura identificou os três T's (Tecnologia, Talento e Tolerância) como factores determinantes para ascender ao ranking das mega-regiões: regiões que acolhem actividades económicas em larga escala e geram a maior percentagem de actividade económica e inovações científicas e tecnológicas, a nível mundial.
Dos 191 países do mundo, só existem 40 mega-regiões que impulsionam a economia mundial: estas representam um quinto da população, dois terços do rendimento económico mundial e mais de 85 por cento da inovação global. A Grande Lisboa está em 33.º lugar na lista encabeçada pela Grande Tóquio, mas poderá ir mais longe, segundo o economista norte-americano.
«A única coisa que vos está a travar é a mentalidade. Portugal tem sido aprisionado por uma mentalidade antiquada», declarou à Lusa, à margem da conferência organizada pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT) e pela Ordem dos Economistas.
Richard Florida antevê um futuro promissor para Lisboa, que já está em fase de transição e atrai classes criativas, mas salientou que é preciso valorizar mais a tolerância e a liberdade de expressão individual (self-expression).
Richard Florida é autor do best-seller The Rise of the Creative Class (A ascensão da classe criativa) e lançou recentemente Who's Your City (Quem é a tua cidade) onde sugere que a escolha do lugar onde vivemos pode ser uma decisão tão importante como escolher um parceiro ou um emprego.
O economista advoga o surgimento de uma classe criativa, associada a sectores com grande capacidade de inovação, e associa o desenvolvimento e êxito das cidades à sua capacidade de atrair esta classe emergente.
Tudo se passa numa sociedade em que o crescimento económico já não é sustentado pela criação de postos de trabalho, nem pelo desenvolvimento de clusters suportados pela indústria tradicional ou pelas tecnologias de ponta.

quinta-feira, 27 de março de 2008

terça-feira, 4 de março de 2008

PORTUGAL

PORTUGAL em 1896

«Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso de alma nacional - reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta (...)
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados (?) na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira e da falsificação, da violência e do roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro (...)
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este, criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do país, e exercido ao acaso da herança, pelo primeiro que sai dum ventre - como da roda de uma lotaria (...)
A justiça ao arbítrio da política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas (...)
Dois partidos (...) sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, (...) vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se amalgamando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento - de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar»

GuerraJunqueiro
in Pátria
(gentilmente enviado pelo amigo antónio)

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Agentes culturais exigem valorização da cultura na cidade

O Teatro Académico de Gil Vicente (TAGV) reuniu ontem diversos produtores culturais, que debateram a relação da cidade com a cultura. Os elementos consideraram que existe oferta cultural de qualidade, mas falta uma política da autarquia na área
«Estamos aqui em defesa dos que fazem cultura em Coimbra», começou por dizer Abílio Hernandez, moderador do debate, perante um público que preencheu quase todos os lugares do TAGV. O debate subordinado ao tema “Cidade, arte e política – o valor estratégico da cultura” debateu o papel da cultura na cidade e foi organizado pelos assinantes do manifesto “Pelo direito à cultura e pelo dever de cultura”, apresentado no passado mês de Janeiro.
O ex-presidente da “Coimbra Capital Nacional da Cultura 2003” defendeu que existe oferta cultural na cidade, mas acusou a Câmara Municipal de Coimbra (CMC) de não desenvolver uma política na área. «A autarquia tem mesmo uma política anti-cultural. Gostaríamos que a câmara estivesse aqui, mas não está, e não é fácil manter um diálogo com uma parede», acrescentou.
O professor universitário e ex-director do TAGV salientou que os agentes culturais «fazem um serviço público à sociedade, como um médico ou um padeiro». «As cidades são cada vez mais iguais e é a cultura que as distingue uma das outras», apontou.
O professor e economista José Reis foi o segundo a intervir. «A CMC ambiciona a pacatez e por isso Coimbra está a desperdiçar o potencial que tem na cultura», afirmou. O ex-secretário de Estado do Ensino Superior falou sobre a relação profunda entre metrópoles e as manifestações culturais. «Cada vez mais as actividades culturais são uma fonte de conhecimento e emprego das cidades», observou. «O papel de Coimbra no país está ameaçado, as políticas públicas são desfavoráveis e a imagem que projectamos de nós próprios e das nossas instituições não é a melhor», disse. Para o economista, «a cultura não é um problema, mas parte da solução da requalificação das cidades».
Já José António Bandeirinha, pró-reitor para a Cultura da Universidade de Coimbra, deu como referência o exemplo espanhol: «Lá, as mesmas pessoas que estão no campo de futebol e na praça de touros estão nos grandes halls culturais. Não há cultura de oposição, há oferta e as pessoas vão a tudo». «Em Coimbra a cultura tem de ser integrada na política da cidade, não pode ser vista como um lixo», explicou.
O painel de oradores foi completado pela socióloga Paula Abreu, que considerou que em Portugal as práticas culturais «estão limitadas por aquilo que é difundido pela televisão e rádio» e acusou a CMC de ter «medidas desarticuladas, sem qualquer política na cultura».
A professora universitária alertou que «as autarquias locais não podem atirar a responsabilidade para o Estado» e considerou que Portugal «está alheado e fechado ao debate cultural há muito tempo».O encontro contava inicialmente com a presença de Manuel Maria Carrilho, mas o deputado socialista e ex-ministro da Cultura esteve ausente devido a doença. António Pedro Pita, director Regional da Cultura do Centro, também esteve ausente, devido a uma reunião em Lisboa.
Debate muito participado
Os cidadãos de Coimbra (principalmente pessoas ligadas à universidade e a instituições culturais) foram sensíveis ao debate de ontem e marcaram presença em peso no Teatro Académico de Gil Vicente. As posições em torno da relação da cidade com a cultura foram diversas.
Ana Pires, ex-delegada do Ministério da Cultura em Coimbra e presidente da ProUrbe,
Apelou para «a resolução de conflitos em matéria cultural, como aqueles que envolvem espaços como o Teatro da Cerca de São Bernardo, o Centro de Artes Visuais ou o Museu de Transportes». «Queremos que os planos financeiros também sejam cumpridos pela câmara», apelou.
Claudino Ferreira, professor da Faculdade de Economia da UC, considerou que a cultura «tem um valor próprio antes de ter um valor estratégico» e concluiu que «quem lida com a cultura na cidade, como a autarquia, gosta pouco da cultura».
Já Luís Reis Torgal, professor catedrático na Faculdade de Letras, afirmou que o documento “Pelo direito à cultura e pelo dever de cultura” devia ter sido «mais amplo e consensual». «Esta cidade bate-se muito pouco pela cultura. Matou-se o [cine-teatro] Sousa Bastos e o Avenida e criaram-se centros comerciais», apontou.
Luís Quintães contestou o facto de a mesa de oradores ser constituída na íntegra por professores universitários. «Dá ideia que a cultura erudita se quer impor à popular, à que vem do povo», protestou.
Durante o período de debate, Abílio Hernandez foi questionado sobre o facto de o relatório de “Coimbra Capital Nacional da Cultura 2003” nunca ter sido revelado publicamente. O ex-director do evento defendeu-se, afirmando que foi entregue ao ministro da Cultura (na altura Pedro Roseta). «Não compete a mim publicar o relatório. Eu nem sei bem se o ministro de então ou se algum ministro da Cultura o leu. Nunca fui chamado a discutir o relatório e se calhar não teve importância nenhuma para ninguém», ironizou.
O Diário de Coimbra procurou entrar em contacto com o vereador da Cultura da CMC, Mário Nunes, para obter reacções às críticas feitas à autarquia durante o debate, mas tal não foi possível.
Depois do manifesto e do debate…Que futuro?
Isabel Craveiro, da direcção do Teatrão, apelou a que o manifesto “Pelo direito à cultura e pelo dever de cultura” e o debate ontem realizado tivessem seguimento.«Somos responsáveis por uma política cultural e não podemos ficar à espera que a câmara o faça. Lanço o desafio para que se façam propostas concretas para uma política na área da cultura», disse. A responsável apelou à articulação entre estruturas culturais e sugeriu a formação de grupos de trabalho, onde se juntariam instituições ligadas a todo o tipo de manifestação cultural.
O moderador do debate, Abílio Hernandez, não partilhou a mesma opinião, considerando que «não se pode exigir que os agentes culturais façam uma política cultural, mas pode exigir-se à câmara que o faça».Após o encontro, Abílio Hernandez afirmou que, para já, não estão programadas mais iniciativas. «Os agentes culturais não têm que ser governantes da cultura, não queremos substituir o papel da câmara, procuramos antes que ela assuma responsabilidades», disse.

21 de fevereiro 2007
Bruno Vicente
Diário de Coimbra

Câmara de Coimbra acusada de ser um obstáculo à produção cultural na cidade


Iniciativa Amigos da Cultura 2008 juntou cerca de 400 pessoas no Teatro Académico de Gil Vicente. Concluíram que a cultura também precisa de cidadãos mobilizados.

Agentes culturais da cidade de Coimbra e os promotores da iniciativa Amigos da Cultura 2008 acusaram ontem a Câmara Municipal de Coimbra de ser um obstáculo à criação artística e de desvalorizar o papel da cultura no desenvolvimento da cidade.No colóquio Cidade, Arte e Política, que juntou cerca de 400 pessoas no Teatro Académico de Gil Vicente, Abílio Hernandez, ex-presidente da Coimbra Capital da Cultura, acusou mesmo os responsáveis autárquicos de promoverem uma política "anticultural". "Há cultura em Coimbra, apesar da câmara municipal. A câmara não só não age como entidade promotora como se assume como agente destruidor de projectos e de dinâmicas. E por isso temos o direito de protestar", afirmou.
Depois do lançamento do movimento Amigos da Cultura através de um blogue, o colóquio de ontem tinha por objectivo discutir o valor estratégico da cultura nas cidades. O ex-ministro da Cultura Manuel Maria Carrilho era um dos oradores convidados, mas acabou por não marcar presença devido a "problemas de saúde", justificou Abílio Hernandez.
José Reis, economista e docente da Universidade de Coimbra, defendeu que actividades emergentes relacionadas com as indústrias criativas são "fonte de conhecimento, de riqueza e de emprego", algo que Coimbra "não tem sabido aproveitar". "E, neste campo em concreto, a câmara é uma entidade causadora de problemas. É uma entidade que não se dá bem com a contradição", afirmou.
José Reis acrescentou ainda que Coimbra sofre hoje "múltiplas ameaças" devido a "políticas públicas que lhe são hostis", mas acrescentou que os cidadãos da cidade devem também assumir-se como "parte do problema". "A imagem que projectamos da cidade e das nossas instituições não é a melhor", concluiu.Ana Pires, presidente da associação cívica Pró-Urbe, acrescentou que a cidade também não se tem mobilizado devidamente para lutar pela cultura. "Nós permitimos que acabassem os Encontros de Fotografia. E isto é um escândalo. Nós permitimos que maltratassem A Escola da Noite. E isto é um escândalo. Nós deixamos que maltratem o que a nossa cidade tem de melhor", criticou. "O vereador da Cultura é muitas vezes responsabilizado pelo estado caótico do sector, mas o principal responsável político é o presidente de câmara", declarou.Apesar de partilhar parte das críticas feitas à actuação da câmara na área da cultura, Isabel Craveiro, de O Teatrão, sugeriu que os Amigos da Cultura formulassem também propostas à autarquia para alterar a situação. "Nós também somos responsáveis pela política cultural na cidade", afirmou. No final, Abílio Hernandez não se mostrou nada confiante na possibilidade de diálogo. "Não é fácil dialogar com uma parede, com quem tem uma visão instrumental da cultura. Se há alguma forma de classificar a política cultural desta câmara, eu diria que ela se rege pela mais enciclopédica das ignorâncias", declarou.
21.02.2008, André Jegundo
Jornal Público

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Semana Cultural da UC

Imaginação dá mote para criação artística «Transformar o comum em extraordinário» e revelar «a cultura como o caminho para a felicidade» são os objectivos principais do evento, que este ano explora o mundo da imaginação enquanto abrigo de universos artísticosDe 1 a 8 de Março, Coimbra vai reunir artes plásticas, música, teatro e cinema, mas também colóquios, exposições e workshops. «Queremos que a iniciativa seja uma experiência de cruzamento entre criadores e públicos e que a universidade dê mais um passo para se mostrar à cidade», adiantou ontem o pró-reitor para a Cultura, José António Bandeirinha, na apresentação do programa da X Semana Cultural da Universidade de Coimbra (UC). Para António Bandeirinha vai ser «um desafio explorar a forma como utilizamos a imaginação e a criatividade para nos integrarmos e integramos os outros». O docente explicou que a semana cultural é sempre um evento que pretende dar dinâmica à cidade, «cruzando iniciativas internas e externas, bem como artistas nacionais e internacionais».O tema de 2008 está subordinado ao universo da imaginação como abrigo da criação cultural. Pela primeira vez o evento tem um assessor de programação. Giacomo Scalisi referiu que o importante «não é apenas programar espectáculos e convidar artistas a partilhar saberes». «É principalmente perguntar porque estamos a fazer tudo isto e qual é o nosso objectivo», explicou.
A organização está a apostar forte na participação do público e pretende que «as pessoas de Coimbra se sintam parte activa do evento». «Queremos ver as artes a entrar na cidade e a dialogar com as gentes que nela habitam», disse. Giacomo Scalisi realçou ainda que a interacção artística entre a semana cultural e Coimbra é relevante porque possibilita «momentos de troca» que levam à felicidade. «É importante porque as pessoas quando estão felizes olham o mundo de outra maneira e reparam em coisas que não viam antes». «Nós apostamos na cultura como o caminho para a felicidade», disse.«Movimentar as artes, chamar o artista de longe com a sua maneira de pensar e possibilitar um encontro entre as pessoas de Coimbra» são outros aspectos que o programador teve em conta para a criação da agenda da X Semana Cultural da UC.Programação “vasta e criativa” revela mundo do insólitoPara além do programador Giacomo Scalisi, a coreógrafa Madalena Victorino também integra a organização do evento. A responsável levantou o véu sobre as iniciativas principais que a cidade vai receber. “Caruma” reúne bailarinos e músicos, num projecto de arte comunitária que pretende colocar o público em contacto com o espaço físico que habita. As actuações têm início com sete elementos, mas o objectivo passa por alargar a participação a dezenas de pessoas do público. A iniciativa “Lembranças” combina teatro e dança e acontece nas ruas de Coimbra. «São espectáculos miniaturas onde, de repente, passa-se de uma situação da realidade para o mundo do insólito», explicou Madalena Victorino.O espectáculo musical «Auprès de ma blonde» também foi destacado na cerimónia de apresentação do programa cultural. Um percussionista e três músicos de instrumentos de sopro vão misturar música de circo e música popular com teatro e muito improviso. Segundo a organização, trata-se de «uma fanfarra de bolso cheia de momentos hilariantes, nascida na rua e alimentada por ela, aberta a tudo, que se instala para redescobrir dias de festa».Madalena Victorino vê a arte «como o caminho para a felicidade». «A arte tem a capacidade de fazer o comum ser extraordinário e, sem ser pretensiosa, é isso que queremos fazer com esta semana cultural», concluiu a coreógrafa.Para além do teatro e da música, a iniciativa desdobra-se em exposições, colóquios, debates e formações em torno do tema da imaginação artística, num programa cultural que inclui mais de 50 eventos. Reitoria e as faculdades da Universidade de Coimbra, através de professores e de núcleos de estudantes, as secções culturais da Associação Académica de Coimbra e organismos autónomos são as principais entidades projectoras da semana cultural, que conta ainda com a participação de grupos estrangeiros.
A décima edição da semana cultural inclui o dia aberto da universidade e a sessão solene comemorativa do 718.º aniversário da instituição, onde será entregue o prémio Universidade de Coimbra ao cientista José Epifânio da Franca.
Retirado do Diário de Coimbra